Velhas histórias

sábado, 20 de abril de 2024

IAGO

     



    Depois de 04 finais de semana sem folga, agora deu um espaço para reflexão aqui. Com a maioria dos médicos que conversei não me lembro de 01 que falou "como era bom meu R1".  Eu fico num mix de "hum... então não é tão legal assim, mas ao mesmo tempo é", afinal a briga para entrar numa residência - que aliás tem ficado cada vez mais difícil esse acesso- foi grande, e agora, eu quero a recompensa.

     A curva de aprendizado sobe para as alturas e junto com ela, o trabalho. Como pode chegar num serviço às 6:30 da manhã, ser 20h da noite e você não parar; você mal almoça e já volta para terminar suas coisas. Mas as coisas nunca terminam.
    Nesses quase dois meses de trabalho, vi hepatopatas, sd compartimental com fasciotomia, diversos canceres, mulher que foi no hospital para sair de casa porque o marido estava perturbando a cabeça, dengue atrás de dengue, e até o famoso caso do rexona que entrou no fiofó "sem querer". 

    Deixo aqui uma passagem de um paciente do hospital (mudando totalmente o tom do texto):


    Um rapazote entre 17-20 anos, alto, magrinho, com tatuagem no pescoço, paciente da ortopedia, ficava passando de cadeira de rodas no corredor onde se encontram os computadores da clínica. Ele passava de cadeira de rodas muito acelerado, subia e descia esse corredor o dia inteiro e sempre muito rápido. De vez em quando parava lá para falar alguma coisa comigo e com meus colegas. A gente chamava ele de relâmpago Marquinhos, porque o bicho só andava acelerado. 

    Um dia ele parou e mostrou um vídeo dele empinando uma moto. Nos dias seguintes, relâmpago parava lá para reclamar que ficava muito tempo ocioso, pois não saia sua cirurgia. Reclamava que seus colegas de quarto cagavam no chão. Fazia reflexões como "IAGO" ao contrário é "O GAI". E assim ia indo. Um dia estava andando rápido de muletas, tropeçou e bateu a boca. Quebrou o dente da frente. O que a gente ria desse menino, quando ele chegou lá dando aquele sorriso sem o incisivo, foi bom demais. Mais alguns dias e nada de sair a cirurgia. Ele começou a andar de cadeira de rodas vestindo capacete de moto. Essa rapaz conseguiu montar uma gangue dos ociosos junto com outros pacientes da ortopedia e da psiquiatria, ficavam jogando UNO e circulando pelo hospital. E, um dia, sem mais nem menos, notamos que ele não aparecia mais. Descobrimos que conseguiu sua operação, e praticamente na manhã seguinte teve alta. Seus capangas da gangue do UNO, tentaram se reunir algumas vezes, mas como o líder não estava mais, a trupe acabou se desfazendo.


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